13 de jul. de 2013

[Poesia] PABLO NERUDA – A casa




-  PEDRO LUSO DE CARVALHO 


PABLO NERUDA, cujo nome de registro civil era Neftalí Ricardo Reys Basoalto, nasceu a 12 de julho de 1904, em Parral, Chile. O poeta morreu na capital de seu país, Santiago, em 23 de setembro de 1973. A sua poesia se caracteriza pela invenção e reinvenção de temas profundamente ligados ao amor e à vida.

Neruda, sabidamente um dos mais importantes poetas dos tempos modernos, deixou uma extensa obra, com mais de 50 livros, que foram traduzidos para vários idiomas, tendo uma vendagem superior a um milhão de exemplares.

O intenso lirismo da poesia de Neruda e a sua criatividade prodigiosa, com cinco volumes de poesia publicados quando contava com apenas 22 anos, na década de 1920, contribuiu fortemente para firmar a sua reputação. O seu segundo livro, Vinte poemas de amor e uma canção desesperada, logo se tornou popular e um clássico, em razão da elegância, doçura e profunda melancolia.

Quanto ser ou não comprometida a poesia de Neruda, a resposta correta é dada por José Miguel Ibañez Langlois, também chileno, nascido em Santiago, professor de Literatura da Universidade do Chile: “Neruda como poeta tem o compromisso imediato que a sensibilidade contrai ante o objeto que a estimula: o corpo da mulher, a paisagem, o espetáculo da fome ou da miséria. Não conhecemos outro compromisso de maior profundidade, de Neruda como poeta”.

No ano de 1940 Neruda começou a escrever um poema épico, para o qual levou elementos da flora, da fauna, da história, da mitologia e das lutas políticas da América Latina. O seu livro Alturas de Machu Picchu, inspirado nas civilizações pré-colombianas, viria tornar-se o centro do épico Canto geral (1950).

Em 1971, a Academia Sueca concedeu a Pablo Neruda o Prêmio Nobel de Literatura.

Segue A casa, poema de Pablo Neruda (in Neruda, Pablo. Antologia Poética. Tradução de Thiago de Mello. Rio de Janeiro: 1964 p. 36-37):


[ESPAÇO DA POESIA]


A CASA
[ PABLO NERUDA ]



Minha casa, as paredes cuja madeira fresca,
recém-cortada ainda recende: desarrumada
casa da fronteira, que rangia
a cada passo, e silvava com o vento de guerra
do tempo austral, fazendo-se elemento
da tempestade, ave desconhecida
sob cujas plumas frias germinou meu canto.
Vi sombras, rostos que como plantas
cresceram ao redor de minhas raízes, parentes
que cantavam toadas à sombra de uma árvore
e disparavam entre os cavalos molhados,
mulheres escondidas na sobra
que deixavam as torres masculinas,
galopes que açoitavam a luz,
                                            contaminadas
noites de cólera, cães que ladravam.

Meu pai com a madrugada ainda escura
da terra para que perdidos arquipélagos
se deslizou em seus trens que ululavam?
Mais tarde amei o cheiro do carvão na fumaça,
as graxas, os eixos de precisão gelada,
e o grave trem cruzando o inverno estendido
sobre a terra, como uma larva maravilhosa.

De repente as portas trepidaram.
                                                  É meu pai.
Rodeiam-no os centuriões do caminho:
Ferroviários embrulhados em suas capas molhadas,
o vapor e a chuva com eles revestiram
a casa, a sala de jantar se encheu de relatos
enrouquecidos, os copos se esvaziaram
e até mim, dos seres, como uma separada
barreira, em que viviam as dores,
chegaram as aflições, as taciturnas
cicatrizes, os homens sem dinheiro,
e a garra mineral da pobreza.



                                                     *  *  *